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Refletindo sobre a prática psicológica no sistema prisional


Data de Publicação: 22 de dezembro de 2005


Em palestra no dia 15 de dezembro, o professor Manoel Mendonça, doutor em Psicologia Social, pesquisador do CNPq e membro do Comitê de Direitos Humanos da Universidade Federal de Sergipe, apresentou trabalho que realiza há dois anos em diferentes presídios sergipanos. Intitulada “Histórias do confinamento do presente”, a pesquisa, cujo objetivo era fazer um retrato do funcionamento cotidiano do sistema prisional do estado, contou com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Secretaria de Justiça do Estado de Sergipe.

O trabalho teve início em um presídio feminino de Aracajú, mais conhecido como “Cortiço”. Segundo Mendonça, a maior parte das internas estavam ali por terem cometido pequenos furtos. Como muitas das internas tinham namorados nos presídios masculinos, Mendonça fez um vídeo com mensagens das presas para os internos, criando assim uma estratégia para se inserir também na Casa de Detenção de Aracajú.

Há dois anos, a Casa de Detenção era considerado um barril de pólvora. Com cerca de 800 homens entre 18 e 25 anos de idade e no máximo cinco anos de escolarização, o presídio era dominado por um pequeno grupo de detentos que aterrorizavam os demais com chantagens e todo tipo de agressões. Em um determinado momento, os presos perceberam que essa situação não poderia mais continuar. “Os internos perceberam que aquilo era um campo de concentração, um perímetro de confinamento. Se a situação não mudasse, eles iriam acabar matando uns aos outros”, disse o professor.

O fim da violência no presídio não teve nenhuma participação do poder público. “Toda vez que a representação pública entra na cadeia gera violência. Só há paz agora nesse presídio porque não há tanta intervenção governamental”, disse Mendonça.

O professor explicou que a lógica violenta do presídio e de outras instituições, como a escola e o manicômio, é necessária para a manutenção do Estado moderno. “Para o modelo de organização social do capitalismo financeiro, os pobres atrapalham. Ele precisa manter vidas em latências, corpos o mais imóveis possível. Aqueles que não aceitam esse tratamento acabam indo parar no sistema prisional”, disse.

Ao falar sobre a função do psicólogo dentro do sistema prisional, Mendonça foi bastante crítico. “Não há como assinar um laudo sem se estar reproduzindo uma violência”. Para o professor, o que a prática institucionalizada da Psicologia tem feito é manter a ilusão de que o Estado se preocupa com a ressocialização dos internos. Mendonça propôs aos que trabalham dentro do sistema prisional que enfrentem os processos de exclusão e a perversidade do sistema.

Segundo Mendonça, romper com a “venda de ilusões” deve ser a meta do especialista. “Não é esperado que se mude isso de uma hora para outra, mas é possível parar de validar esse sistema. Falar e deixar passar o discurso da instituição é a nossa forma de confinamento. Mas para sair desse impasse é simples. Linhas de fuga podem ser construídas por pessoas, mas não por papéis funcionais, que só produzem violência.”